Agência e distribuição na jurisprudência do STJ
1/14/20255 min read
1) Este post refere-se especificamente ao contrato de agência e distribuição objeto dos arts. 710 e ss. do Código Civil. O Superior Tribunal de Justiça já respondeu a importantes questões relativas a essa modalidade de contrato típico, o qual, com o advento do CC/02, despertou muitas dúvidas sobretudo no que se refere à sua diferenciação em relação à representação comercial e ao contrato atípico de distribuição tradicionalmente estudado no direito comercial (distribuição-intermediação).
2) Nenhum estudo de um instituto jurídico ou operação responsável com tal instituto no cotidiano forense dispensa o conhecimento do status quo da jurisprudência superior a ele relativa. Assim, como material de apoio para estudos doutrinários e lida forense, enunciamos abaixo as questões importantes já respondidas na jurisprudência do STJ sobre o contrato de agência e distribuição:
2.1) Quais são as diferenças entre os contratos de agência e distribuição regulados nos arts. 710 e ss. do CC/02, e quais são as diferenças entre esses contratos e o contrato atípico de distribuição? Segundo o voto condutor do julgamento do REsp n. 1.784.914/SP (relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 23/4/2024, DJe de 30/4/2024), a diferença entre a agência e a distribuição, no âmbito do CC/02, está em que: (1) na agência, alguém é contratado para alcançar terceiros interessados na aquisição dos produtos ou serviços oferecidos pelo agenciado, com ou sem obrigação de concluir os negócios; e (2) na distribuição, o distribuidor, além disso, dispõe dos produtos que serão negociados. Esses dois contratos, por sua vez, denominados conjuntamente de “contrato de agência e distribuição” (ou "contrato de distribuição-aproximação"), diferenciam-se, segundo o julgado, do contrato atípico de "distribuição-intermediação", pois: (1) no contrato de distribuição-intermediação, o distribuidor compra, com condições especiais, a mercadoria fabricada pelo fornecedor e obriga-se a revendê-la, o que não ocorre no contrato de distribuição-aproximação; (2) no contrato de distribuição-intermediação, o distribuidor extrai sua remuneração da diferença entre o preço de aquisição e o de revenda, enquanto que, no contrato de distribuição-aproximação, a remuneração dá-se mediante comissão a ser paga pelo contratante; e (3) o contrato de distribuição-intermediação é atípico, competindo “às partes contratantes a autorregulação das condições que regerão a avença”, enquanto que o contrato de distribuição-aproximação é típico, estando regulado nos arts. 710 e ss. do CC/02. No mesmo sentido, o julgamento do REsp n. 1.799.627/SP (relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 23/4/2019, DJe de 9/5/2019), em que o contrato atípico de distribuição-intermediação é denominado "concessão comercial" e "contrato de distribuição autêntico", e se aponta mais uma distinção importante em relação ao contrato dos arts. 710 e ss. do CC/02, a saber, que, neste último, o contrato de venda da mercadoria é feito entre o fornecedor e o terceiro, tendo o agente-distribuidor apenas agenciado a transação, enquanto que, na comissão mercantil, o distribuidor, ao revender a mercadoria ao terceiro, contrata com este em nome próprio;
2.2) Há diferença entre os contratos de agência e distribuição regulados nos arts. 710 e ss. do CC/02 e o contrato de representação comercial autônoma regulado na Lei 4.886/1965? O julgamento do REsp n. 1.784.914/SP (relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 23/4/2024, DJe de 30/4/2024) manifesta o entendimento de que não há uma tal diferença, de modo que o “contrato de agência e distribuição” dos arts. 710 e ss. do CC/02 equivale ao contrato de representação comercial, tratando-se apenas de uma nova forma de denominá-lo (“o novo Código Civil conferiu ao provecto contrato de representação comercial a nova denominação de contrato de agência, alinhando-se à terminologia majoritariamente adotada pela legislação estrangeira”). O CC/02 e a Lei 4.886/1965 regulam, portanto, uma mesma modalidade contratual. Segundo o julgado, para o caso de conflitos entre as normas dos dois diplomas, a Lei 4.886/1965 deve ser considerada norma especial, e o CC/02 norma geral. Também pressupondo a identidade entre o contrato de agência e distribuição e o contrato de representação comercial, a Quarta Turma, no julgamento do AgInt no AREsp n. 1.504.367/SP (relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 14/3/2023), decidiu pela incidência, em contrato de agência e distribuição, do prazo prescricional quinquenal da Lei 4.886/65, art. 44, parágrafo único;
2.3) É permitida a cláusula del credere em contratos de agência e distribuição dos arts. 710 e ss. do CC/02? No já referido julgamento do REsp n. 1.784.914, a Quarta Turma do STJ, coerente ao entendimento de que o contrato de agência e distribuição do CC/02 equivaleria ao contrato de representação comercial autônoma, entendeu ser vedada, em tal contrato, a cláusula del credere, haja vista o art. 43 da Lei 4.886/1965;
2.4) Há corresponsabilidade do contratante pelos danos causados pelo distribuidor a terceiros? No julgamento do REsp n. 1.841.563/AL (relatora Ministra Nancy Andrighi, relator para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 2/6/2020, DJe de 9/6/2020), a Terceira Turma do STJ, por maioria, decidiu que a concedente não deveria responder por danos causados a terceiro por distribuidora de suas mercadorias (no caso, danos sofridos pelos filhos de pessoa que veio a óbito em razão de atropelamento por veículo da distribuidora). Nos termos do voto vencedor, a existência de típico contrato de distribuição, regulado pelo CC/02, afastava a existência de relação de emprego entre a concedente e o condutor do caminhão, além de descaracterizar situação de preposição da distribuidora em relação à concedente. Enfatizou-se, também, que o distribuidor, nos termos do art. 710 do CC/02, atua por sua conta e risco;
2.5) Em que situações da casuística o STJ já entendeu haver ou não haver um contrato de agência segundo as normas dos arts. 710 e ss. do CC/02? Entendeu-se haver contrato de agência na relação entre a seguradora e o agente autônomo de seguro (REsp n. 1.391.092/SC, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22/4/2015, DJe de 10/2/2016, Tema Repetitivo 729); e na promoção de venda de quotas de consórcio (REsp n. 1.676.623/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 23/10/2018, DJe de 26/10/2018). Entendeu-se não haver contrato de agência na representação de seguros regulamentada pela SUSEP (REsp n. 1.761.045/DF, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 5/11/2019, DJe de 11/11/2019).
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